terça-feira, 11 de janeiro de 2011

O QUE PODEMOS PODAR ?



Muitas coisas precisam ser podadas em nós. Carecemos muito da intervenção do jardineiro celeste. Os parasitas da atualidade são muito mais letais, muito mais nocivos. Vivemos num século da desumanidade, da deterioração da beleza. Nossos galhos agonizam numa poeira pós-moderna asfixiante.

Uma das coisas que precisamos podar é a ambição desmedida. A busca alucinada por sucesso, fama, garantias profissionais e financeiras, segurança, estabilidade. Estamos como prisioneiros de um velho pecado que surge hoje com cara nova: a ambição. Antigamente era considerada um grande mal, hoje, é aclamada, valorizada, buscada e desejada. Foi “santificada”, transformou-se virtude. O grande problema desse parasita, é que ele, sutilmente, inverte os pólos, levando-nos a deixar de ser criaturas para ser criadores.

Para que possamos viver plenamente, precisamos estar inseridos nos termos da criação. Isso implica viver debaixo de uma ordem definida na criação, ou seja: Deus ama e nós somos amados; Deus cria e nós somos criados; Deus revela-se e nós recebemos a revelação; Deus ordena e nós obedecemos. Isso nos leva a crescer como criaturas, aceitando o Criador, entendendo que não somos nós que damos sentido ao mundo, é Deus. Ser cristão é aceitar os termos da criação. Isso nos livra da tentação de viver num mundo sem criador. Isso nos livra de carregar um peso que não é nosso. Se o jardineiro divino podar nossas ambições, seremos livres para amar, para ser conduzidos e para ser abençoados.

Outra coisa que necessitamos ser podados é a ingratidão. Elas nos torna pessoas insatisfeitas. Nunca temos o suficiente, sempre há alguma coisa em falta (ou alguém). Perdemos a capacidade de ver Deus agindo nas pequenas coisas, a alegria de perceber sua graça nos detalhes. Como efeito colateral disso, perdemos a capacidade de confiar. Somos aprisionados na dependência de nós mesmos, numa masmorra da autossuficiência.

Nessa busca por autoconfiança, encontramos apenas ansiedade e desespero. Fechamos as portas da alma para a presença alegre e libertadora do Espírito Santo. Somos engendrados numa teia agonizante de reclamações, onde perdemos a capacidade de perceber o cheiro das flores e o sabor dos frutos. Galhos marcados pela esterilidade.

Quando Deus poda a ingratidão, abrimos a alma para a generosidade. Valorizamos o dar ao invés do receber. Aprendemos a ir ao encontro do outro, redescobrir o bendito movimento para-o-outro, ao invés de esperarmos que o outro nos encontre. Aprendemos a oferecer a mão, o ombro, o carinho, a compaixão, ao invés de lamentar o abandono e a solidão. Ao invés de buscar bênçãos, tornamo-nos bênção para os outros. Exalamos o perfume das flores que a poda divina fez nascer em nós novamente.

Também precisamos podar a apatia ou acomodação. A apatia (do grego: a + patós: sem sentimento) é a fonte da anemia espiritual. Ela nos torna descuidados, displicentes, acomodados. Aliás, não há nada mais feio do que um jardim abandonado. As roseiras que não foram podadas no tempo certo, que cresceram desordenadas, não têm mais forças para fazer as rosas brotarem, misturam-se com o mato, tornam-se semelhantes a ele. O que o jardineiro celeste faz é limpar o mato, tirar o excesso, abrir os caminhos para a circulação da vida. Podar é possibilitar novamente o fluxo da vida, o viço da beleza, o crescimento saudável.

Quando descuidamos da vida devocional, da oração, quando o descaso para com a igreja cresce, o abandono da comunhão acontece, o mato vai crescendo e sufocando a vida. Outros hábitos vão sendo formados, passamos a gostar de outros lugares, a ter prazer noutras coisas. O mato começa a fazer parte da paisagem, toma conta do jardim. O que é mais triste é que só daremos conta do mal quando o fruto vier apodrecido, isto se vier algum fruto.

Podar a apatia ou acomodação é renovar alianças e votos. É permitir que a seiva da graça de Deus volte a correr por todos os canais, trazendo de volta a vida e a paixão por Deus, pela família, pela igreja. É voltar os olhos para o futuro e, como o jardineiro – que logo após a poda, deixa a videira mutilada e feia – saber que, após alguns dias de chuva e sol, ela renascerá cheia de vida, bela, radiante e admirada pelas cores e pelo perfume.

Uma certeza temos: precisamos da poda! É doloroso, mas necessário. Existem muitos ramos que já não frutificam. O mato tem sufocado a espiritualidade, eliminado o perfume, apagado as cores. Jesus deixou claro que o destino de tais galhos é o fogo da destruição, uma vez que já não servem. A lição que fica aqui é muito importante: Deus anseia por nos libertar de nossa própria debilidade, ele anseia mostrar ao mundo sua beleza em nós, seu perfume em nós, sua glória. É a arte do jardineiro na pobreza do galho.

Temos uma verdadeira alegria, pois ainda que as crises façam o mato crescer, temos um jardineiro atento e pronto a nos podar para que nossos frutos sejam dignos e belos.

“Você já notou a diferença existente na vida cristã entre obra e fruto? Uma máquina pode realizar sua obra; só a vida produz fruto”. Andrew Murray

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